quarta-feira, 9 de abril de 2008

dO MaNiCóMiO pArA o FiM











Após as saídas do Alfredo e do Tó Pê, o Iodo mudou.
Entram o Raúl Alcobia e o Zé Luís Barros, para a bateria e o baixo, respectivamente.
Muda também parte do som do Luís Cabral ao adquirirmos um sintetizador polifónico Roland Juno, na Cauis, no Porto, demonstrado genialmente pelo Quico, o teclista dos Salada de Frutas. O Juno, junto com os outros dois teclados vieram reforçar a criatividade do Luis, bem como a predominância das teclas no nosso som.
É na Caius que adquirimos também a nova bateria do Alcobia, uma Pearl branca e linda, com a tarola e timbalões no formato "ron-ton-ton", com excelente visual mas de dificil afinação no som. Para o Luís Barros, um excelente baixo e amplificador Music Man .

Com a renovoção de secção rítmica e de parte do back-line, o Iodo ganha novas formas em práticamente todas as vertentes, e principalmente no plano musical. Os novos musicos vieram dar uma nova consistência rítmica ao Iodo, que vai mudando o dos singles, para algo mais amplo. Muitas desbundas entre mim, o Luis Barros e o Alcobia, tinham alguma influência ritmica dos Police, por exemplo. Daí nasceram alguns esboços de temas tocados em palco, e dois deles gravados no Manicómio.

Aos poucos, e entre concertos, foram surgindo temas que fugiam à linha do Malta à Porta, tais como o Ceby, Expiração de um Louco, ou Ventos do Além, tema que me veio à mente na praia do Meco, e que transcrevi para a viola mal cheguei a casa. Incrível como tudo me surgiu assim na mente, sem qualquer esforço.

Nos concertos, o Iodo soltava-se de uma forma diferente, com esta formação. Dando lugar à elaboração mais cuidada do espectáculo. A máquina funcionava bem. Tinhamos o Marrucho como road-mananger, que mais tarde vai para os Madredeus, uma equipa dedicada de roadies, aos quais chamavamos carinhosamente de pretos, que cuidavam ao detalhe das exigências dos musicos. O Lourinho no som, o João "Boneco", o Luís, o Menezes e o Abílio, montavam o PA, luzes, back-line, muitas vezes sem dormir, aguentavam o concerto, desmontavam tudo outra vez. Era amor à camisola mesmo, dado os míseros escudos que ganhavam

Foi a época aurea do Iodo, em que se alugavam carros à Avis, se dormiam em bons hoteis, tinhamos uma pequena legião de meninas a rodear-nos, e os contratos sucediam-se. Musicalmente o nível subiu graças à maturidade natural que o Iodo adquiriu, e a inclusão dos novos temas nos concertos era bem aceite por parte do público, embora claro, o nosso "Cavalo de Corrida" fosse o "Malta à Porta", que habitualmente tocávamos duas vezes, e por vezes três. Uma, entre as primeiras músicas do concerto, e as seguintes já no encore, que começava num género reggae um pouco na linha do Ventos do Além.

Não sou apreciador dos concertos onde não haja lugar ao improviso. Um concerto com tudo certinho soa a produto embalado, e num palco tem de haver espaço à criação expontânea. Ao improviso. Ao inesperado. O Iodo tinha nos seus concertos, bons momentos em que cada um podia dar largas à sua imaginação, e que nos davam muito gozo, e ao público também.

E é neste cenário um pouco eufórico e com o boom do Rock Português a bombar, e sabendo as editoras que havia que espremer ao máximo e rápidamente o filão de dividendos que cada banda pudesse dar, é-nos proposto editarmos um LP.

Penso que o Manicómio, assim se chama o nosso testemunho LP de vinil, foi o princípio do fim do Iodo. Ou de outra forma, a saída do Alfredo e do TóPê, ditaram o fim da essência do Iodo, para dar lugar a uma banda mais "certinha" e parametrada, que junto com a aventura do LP, e de outras opções erradas, no meu ponto de vista, em conjunto contribuíram para o fim de uma banda que podia ter ido mais longe. Falo da decisão de adquirir um novo PA, com encargos muito elevados para a banda, numa época em que se notava já uma desaceleração nos contratos. E sem contratos não haveriam receitas. Impunha-se ao Iodo reservar-se e acautelar-se e não avançar desenfreadamente, para depois morrer antes de chegar à praia, o que no caso do Iodo não deixa de ser caricato, dadas as origens do nosso nome.

O Iodo não estava preparado, e esta é a minha opinião muito pessoal, para a criação de um LP, não obstante a pica que isso dá a qualquer banda e a qualquer musico na idade dos 20 e tal. No meu entender, atendendo ao mercado, à nossa frágil maturidade e até ao bom senso, impunha-se um single forte. Um single que recuperasse a glória do Malta à Porta, e fizesse esquecer o modesto impacto de A Canção. Ao Iodo era necessário avançar com pés no chão e não embarcar em sonhos voláteis com custos irremediáveis, como veio a acontecer. Eu colcaria no mercado um single com o Expiração de um Louco, no lado A e com o Ventos do Além no lado B, e não duvido que o disco sería um sucesso.

Em A Expiração de um Louco, tema do Luis Cabral, temos tudo o que caracterizou o som da banda, e mais um pouco. Abriram-se outros caminhos. Neste tema que começa com as teclas do Luís, imagem de marca do nosso som, temos aquilo que considero fundamental: a identificação da banda. Tipo, escutamos aquele som de guitarra, e sabemos que são os Queen, por exemplo. Neste tema isso acontece.
Quando entra o resto da banda, com a secção ritmica e a guitarra, temos o som Iodo, embora o tratamento do som de estúdio foi sendo amaricado, contra minha vontade, pois eu preferia dar-lhe um cunho mais agressivo e roqueiro do que o que escutamos no vinil. O refrão evoluía num reggae, que dava um bom contraste, para depois fluir num solo de teclas outra vez no andamento mais roqueiro e desaguar num solo de guitarra meio Robert Fripp/David Gilmour/Steve Hacket, guitarristas que sempre admirei e me influenciaram. O final da musica era uma autêntica trip em cima e fora do palco, culminando com a célebre frase repetida, que os nossos fâs adoravam: "só queria para mim, para mim, um monte de erva".
Esta frase ficou identificada com a erva que se fumava na época, mas erradamente. O que o Luís queria mesmo dizer na letra, era erva-erva, de jardim, de relva, e nunca a de fumar. E logo o Luís que nem fumava, e não bebia alcool.

O Ventos do Além, modéstia aparte, era também um tema forte, que no meu entender, devia incorporar o lado 2, mostrando uma faceta diferente do Iodo, um lado mais calmo que é demonstrado neste tema, e no instrumental que fecha os lados A e B do LP. Pela adesão que teve por parte do público desde o início em que o tocámos em palco, podia ter sido uma musica mais marcante na época, se mais tocado nas rádios, em contraste com os quase todos temas de verdadeiro esgalhanço que quase todas as bandas apresentavam.

Creio que com este single, e uma boa gestão, o Iodo podia dar mais um passo e amadurecer para o tal LP.
Mas para isso era preciso amargar a travessia no deserto que se se anunciava devagarinho...

No entanto, outras vozes falam mais alto, e aqui faço a mea culpa, pois também me entusiasmei e me deixei ir na onda do LP, e na preparação das guitarras a inserir. Qual o musico que não fica com a pica toda?

A mudança do Iodo alastrou por outros caminhos.Por via dos concertos, algum mediatismo e imaturidade, um pouco antes do projecto do LP, o Iodo começa a sofrer de uma crise de vedetice que atacou particularmente alguns membros da banda. E aqui começa o meu desalento, e começa a morrer o meu sonho. Com a proposta do LP, a vedetice tomou maior dimensão.

É aqui que, não desmerecendo nenhum dos elementos fundadores e substitudos da banda, que vejo confirmado o fim do Iodo enquanto banda coesa. Enquanto o projecto original.
À saída do centradíssimo Alfredo que tinha um método de gestão irrepreensível, e não creio que deixasse o Iodo entrar por aquelas vias, entra o Alcobia, musico mais batido, que conferia uma dinâmica mais versátil à banda, no plano musical, mas não à sua essência. Em matéria de gestão não tinha voz na matéria.
À saída do TóPê, essa inevitável, por via da instabilidade que ele causava, pois o TP era um anti-norma, entra o Luís Barros, que conjugava muito bem com o Alcobia. Mas não tinha aquela inspiração do "Aqueles Dias". O TP deveria ter escrito temas para o Iodo, após a sua saída...
Diría que ganhamos mais confiança, versatilidade, e força na secção ritmica, mas perdemos na essência, e na veia inspiradora do que se pretendia ser o Iodo.

E as mudanças começam a notar-se. A fazerem-se presentes. Algum mal estar começava a pairar. Já não havia união. Havia como que um grupo dentro do grupo, tipo segredinhos de escola.

Ao contrário do que fora decidido no início da banda, e executado nos singles, nas composições para o LP, deixámos de assinar os temas em grupo, passando a ser divulgado, o autor de musica e letra, e claro, nos registos da SPA, Sociedade Portuguesa de Autores. O intuito, é lógico, seria criar mais dividendos aos autores.

O Iodo deixara de ser o sonho de uma banda diferente, com um conceito próprio da sua musica, e partilha de tudo o que dizia respeito ao grupo, para se tornar numa tentativa de empresa, tal era a convicção de que a galinha daría sempre ovos. Dentro da empresa Iodo, e aliás, muitas bandas funcionam assim, passaram a existir os sócios, e cada um teria a partir dessa decisão, teria os seus rendimentos separados.
As composições até ali criadas e debatidas em grupo, começaram a surgir já em formato quase final, num esforço de colocar o maior numero possível de temas da mesma autoria no LP, em prejuízo de outros, já rodados em palco e com comprovada aceitação.

A gota de àgua foi a substituição da letra do tema "Lendas", inicialmente da minha autoria, a qual vim a descobrir recentemente nem ser da autoria de nenhum elemento do Iodo, mas sim de um amigo do Luis Cabral... Senti-me traído.

E assim, fui para estúdio, já de cabeça feita para saír da banda. Participando como guitarrista e elemento fundador mas já descrente do projecto, juntemos que não gostei do tratamento dado em estúdio aos temas, e à sua própria escolha. Transformaram-se temas viris em temas amaricados e plastificados. Morre o Rock e vive a onda Blitz, em quase todo o Manicómio.
Contudo vivi a experiência do estudio, o da Valentim de Carvalho, em Paço d'Arcos, não a todo o gas, pelos motivos invocados, mas como é óbvio, sendo também o pai da criança, com empenho e deslumbramento. Dedicando-me com toda a intensidade às gravações, que foram feitas em dois apenas.
Aqui se vê com que respeito as editoras tratavam o pessoal na época: colocar uma banda a gravar um LP em dois dias.... As guitarras, acústica incluída, foram metidas numa manhã, só para dar um exemplo da pressão a que fomos submetidos.
O Manuel Cardoso revelou-se-me um produtor inviável para o projecto Iodo. O que ele fez foi cortar pedaços às musicas, e na mistura final, amaciar por completo o som do Iodo, com a colaboração de quem com ele assistiu ao processo. Não me recordo de o ver assistir um concerto nosso a fim de captar o som da banda em palco, e tentar ser fiel a esse som no vinil.

Comparando o som dos singles com os resultados ao vivo, eu afirmo que existe coerência e fidelidade.

Comparando o som do Manicómio, com as execuções em palco, eu digo, nada a ver.

Aí pode estar parte do motivo do fracasso nas vendas do album. O pessoal não compou. A crítica foi implacável. Alguns se devem ter questionado, se quem tocava o Malta à Porta era a mesma banda que tocava o Ceby.
O meu som de guitarra não é aquele, nunca foi. Salvem-se algumas excepções a alguns solos, e aos dedilhados acústicos que introduzi.
O som do Alcobia era bem mais forte, bem mais marcado, e não aquele som redondinho, muito certinho que aparece no registo. O Alcobia é roqueiro, não é aquilo que se ouve no disco.
Pelo que após efectuar os meus registos musicais no vinil, anunciei à banda a minha saída do Iodo. Juntando os motivos que me levaram a decepcionar-me com o projecto, ao facto da faraónica ideia da aquisição de um novo PA, eu saí do Iodo pela porta que havia, uma, mas com a sensação de saír pela dos fundos.
Já não promovi o LP, não fiz mais concertos, nem tãopouco participei na escolha e concepção da capa. Só a vim a conhecer num exemplar que comprei já fora da banda e que hoje possuo, na minha biblioteca vinil.

Após a minha saída entra o Padinha para me substituir.
Pouco depois sai o Alcobia e entra o Luis Desirat.
Pouco mais tarde o Iodo acaba.

Foi um final inglório para o Iodo, bem como a minha saída o foi.
Alguns amigos na época me perguntaram porque saí e não acreditei no projecto até ao fim. Porém aquele não era o projecto iniciado, em que tudo era decidido com o acordo de todos, tanto na composição como na gestão.
Além de não me sentir motivado, havia que pensar no que eu sempre previ e alertei sobre o mercado. Ao boom, naturalmente se sucederia uma travessia no deserto, e só as bandas estruturadas e preparadas conseguiriam ultrapassar essa travessia, e acima de tudo que aacreditassem no projecto.
As dificuldades finaceiras, graças ao endividamento com o PA, juntas com a falta de concertos e ao desaire do Manicómio, ditaram o fim.

E assim foi a minha passagem pelo Rock Português. Ainda cheguei a fazer um ensaio com os UHF, por via do António Manuel Ribeiro, mas por incompatibilidades profissionais da minha parte, que entretanto assumi, não passou disso, de um ensaio.

Dos elementos do Iodo, mantenho algum contacto regular com o Rui Madeira, com o Alcobia, e com o Alfredo.
Estive uma vez com o TóPê, este sempre no mundo dele. Do Luís Cabral, sei que está em Angola, e do Zé Luís Barros, nunca mais tive notícias.
Ao que parece, sou o único que mantém a actividade musical.




Lado A

Ceby
Lendas
As Novas das Tesouras Velhas
Foz de Um Beijo
Introdução Para o Lado B




Lado B


Expiração de Um Louco
Ventos do Além
Instrução Mental
Deixo-me Ir?
Conclusão de B e Introdução para C







Contracapa interior B


Madeira

Alcobia

Luís Barros







Contracapa interior A

Eu

Luís Cabral

Madeira









Contracapa B

3 comentários:

celeste pedro disse...

olá,

Já lá vão muitos, muitos anos (uns 24 anos). Fiquei contente por saber que não estás a deixar o iodo cair no esquecimento.

Gosto daquela foto em que apareço no palco.

Beijinhos

Celeste

All those years ago disse...

é engraçado como as coisas se encontram... quem escreveu a letra do "Lendas" fui eu, embora valha a verdade o Luís a cortasse porque a métrica não cabia na música; também escrevi a letra do tema "Iodo" que segundo sei só tocavam nos concertos.

Alberto Malheiro
albertomalheiro@hotmail.com

Mário Nunes disse...

Gostaria de comprar este LP bem como os singles alguém os tem disponiveis.
Agradecia contacto as1534852@gmail.com