quarta-feira, 27 de junho de 2007

dos singles à remodelação




A máquina discográfica é essencialmente para fazer dinheiro. Embora tenhamos que entender o prisma comercial, não podemos aceitar certas aberrações que em limite do ridículo colocam no mercado vómitos tais como o Zé Cabra, enquanto outros critérios de cabeças brilhantes não gravam a Marisa ou o Carlos Paredes, daí que certos registos destes colossais artistas só estejam disponíveis em editoras de Europa à qual nos dizem estamos inseridos.


Quero com isto dizer que as editoras põem e dispõem. E tão mais quanto o artista ou a banda sejam pequeninos no seu tamanho.


No nosso caso, verificámos que a nossa Vadeca, no embalo do êxito do Malta à Porta, pegou no material que estava gravado e lá vai disto, lançou mais um single.


Lembro que na altura o Iodo não aprovou muito bem a ideia, pois não considerávamos os temas muito fortes, ou tão fortes com os do 1ºsingle.


Na óptica da editora, era preciso dar continuidade ao exito que a banda estava a obter, e nada mais que o lançamento de um 2º single para demonstrar que o Iodo estava em altas.


O sucesso deste single foi bem menor. Digamos que viveu as sobras do Malta à Porta. Não houve 1ºs lugares nos tops, nem causou tanto impacto no geral.


Musicalmente creio que está na linha e estilo que praticavamos em palco e é coerente nestes


dois discos.


Este disco serviu para uma coisa muito importante para quem era fã do Iodo. A partir daí o nosso público conhecia quatro temas nossos, e em concerto isso faz muita diferença.


A aceitação de temas conhecidos é muito maior, bem como a participação do público.




Esta é a época em que a nossa agenda de contratos se multiplica. Em que chovem pedidos de preços. Em que nos tornamos solicitados.
E assim, o Iodo teve nesta época uma fase estável e progressiva, não sem existirem alguns problemas com a disciplina, no que toca ao TóPê, que tinha uma enorme dificuldade em se integrar no nosso mundo. Ou seja, com o crescimento do Iodo, em termos de ensaios, actuações, promoção, compromissos vários, tornou-se necessário um rigor de horários, e isso para o TóPê, não fazia qualquer sentido. Acredito que muitas hostilidades que ele provocava, não era mais que uma forma de ele nos desafiar, pois ao desafiar-nos estava a desafiar e a contestar todo o sistema, e o TóPê era um puro. Um génio puro, cujos padrões eram incompatíveis com os padrões da sociedade, onde o Iodo estava inserido.
E temos com exemplo o TóPê a saír do palco, em plena actuação, a no meio de uma música tirar o baixo e começar a bater com ele no chão do palco, provocando um mega feed-back de graves em todo o PA.
Tenho que aqui referir dois episódios, do melhor que guardo do TóPê,durante este período:
-Estavamos em Castelo Branco, eu ele e o Alfredo, numa pensão onde pernoitamos, com horário marcado para saír, e o Tó não saía do quarto. A malta batia, batia e nada. Nem sinal do TòPê, nem com murros e gritos.
Ao fim de uma boa hora, finalmente ouvimos de dentro do quarto esta frase:
-Sua excelência está a descer.
O gajo estava a cagar.....E o tempo todo de espera se deveu ao facto de ele se sentar na sanita UMA HORA à espera da vontade fisiológica.
-Integrámos um grupo de artistas e bandas que se reuniram no Rossio em torno de um concerto cujo tema era manifestarmo-nos contra as armas nucleares. O nome do evento era No nuks.
A dado momento, e já quando estavamos num improvisado camirim, fardados com o nosso fato azul, à espera que a banda que nos antecedeu tocásse o seu último número, o TóPê vira-se para mim e pergunta:
-Ó Trindade, nós vamos tocar num espectáculocontra as armas nucleares, estamos a manifestar-nos contra,não é?
Eu, habituado a perguntas desconcertantes dele respondi paternalmente:
-É, estamos a manifestar-nos contra, tocando no evento.
Ele:
-E se não tocássemos?
Eu:
-Bem se agora não tocássemos, depois de estarmos anunciados, seria uma bronca.
Ele:
-Mas era considerado contra na mesma!
Eu:
-Bem, se não tocássemos seria verdadeiramente polémico. Devia causar muito mais impacto.
E foi o que ele quis escutar...
A outra banda entretanto termina, vem alguém dizer-nos que dali a 10 minutos subimos. Passam os 10 minutos, o Iodo é anunciado lá em cima do palco. Existiam uns degraus a subir até lá, subo os degraus e recebo a guitarra do meu roadie, e a seguir devia subir o TóPê,cujo roadie, já segurava a guitarra. E o TóPê desata numa correria pelo Rossio fora...
O pessoal todo: o Tó fugiu!!!!
Eu:Agarrem-no, vão atrás dele, que o gajo não quer tocar.
E o TóPê foi agarrado ao pé do Tivoli, que para quem sabe dá uma boa corrida.
O resultado é que o Iodo deu o concerto, com o TóPê a ser vigiado de perto por todo o staff , e de facto causou polémica.



Entre outros contratos surge-nos um convite para em 26/06 fazermos a 1ª parte do Iggy Pop, o gajo do Wild One.

Foi um misto de orgulho e vaidade com um certo pânico de nos vermos com tão grande responsabilidade.

Quem conheceu o Pavilhão do Dramático de Cascais, como eu, e assistiu a um concerto daqueles em que o pessoal se comprime todo até não caber mais um, e levar com aqueles mega-watts todos na carola.


Como poder descrever o peso que teve para mim, saber que ía tocar no Pavilhão, onde anos antes na forma de fâ incondicional dos Genesis , assisti ao concerto mais que histórico deles em 75, com todo o mediatismo e grandiosidade que envolveram esses dois espectáculos, na Catedral, assim era chamado o Dramático.

De repente, embora não o sendo na verdade, pois houve um percurso, eu estaria do lado de lá, no palco, em vez de ser mais um gajo na assistência a debater-se por um lugar melhor.
Creio que eu e o Alfredo, devido à nossa idade e experiência, acusámos mais que os outros elementos da banda, o verdadeiro peso de ali actuar. A responsabilidade de saber pode colocar-nos de sobreaviso, mas também nos trás o receio e o nervoso muidinho, que em cima do palco... deixa de ser miudinho.
O Luís e o Madeira, viviam só o entusiasmo, E o TóPê, na sua quase permanente alienação ao mundo real, creio que considerou este desafio como apenas mais um concerto.
De qualquer forma, nenhum previa o desastre que iría ser, a que considero a nossa pior actuação, e por conseguinte uma grande desilusão.

sexta-feira, 25 de maio de 2007

da sala de ensaios para o Estúdio




A 3 de Fevereiro de 1980, o Iodo faz a sua estreia no Rock Rendez-Vous.


Ao entrar pela primeira vez no RRV, tive um misto de sensações boas. Nada do que eu vira até ali se comparava com o RRV. A sala parecia perfeita para tocar. A acústica, a envolvência, o palco não muito grande mas perto do público. Tudo isso nos impressionou.


Lembro-me de ir para o 1ºandar, vulgo balcão, onde se situava a regie, e escutar o recentíssimo Abacab dos Genesis. O som era muito bom. Dos Genesis e do RRV.




O back-line desta formação foi sempre o mesmo.



O Cabral, com um ARP e um sintetizador Roland nos teclados, amplificado pelo Farfisa.



O Tó Pê, com o baixo Ibanez, e o amplificador HH.

O Alfredo com a sua irrepreensível e imaculada bateria.


E eu com a Ibanez, cópia descarada da Gibson, que aparece nesta deslavada foto, e o meu fiel Yamaha.

Tocar no RRV teve vários saldos positivos. O prestígio, a publicidade (na época eram publicitados os espectáculos no Sete), e o mais importante, o contacto para a gravação do disco.

A mim em particular, trouxe-me uma prenda inesperada. A Gibson.

Tinhamos agendados dois concertos, um no dia 3 e o outro a 5. No dia 3 a coisa correu bem, para a primeira vez, mas deparámos-nos com uma dificuldade de amador. A minha Ibanez desafinava com facilidade, e isso não se podia admitir numa banda à séria. Por outro lado fazia falta uma 2ª guitarra, pois é não raro um corda se parte num"esgalhanço" mais inspirado, ou numa palhetada mais agressiva. Mis e Sis era sempre a aviar.
E é assim que o Iodo decide comprar uma guitarra no dia 4, na Custódio Cardoso, ali no Chiado. Haviam umas quantas guitarras, não muitas, e em destaque a The Paul, marcada por 60 contos, e foi essa que veio conosco, por 54...

Guitarra que me tem acompanhado por todos estes anos!!!

Num desses dois concertos no RRV fomos abordados por um personagem conhecido das lides musicais desde os anos 70. O Manuel Cardoso, que há época tinha como projecto pessoal a figura do Frodo, numa pausa aos Tantra. A proposta era irrecusável: o MC estava a iniciar a sua carreira de produtor e tinha como missão a de recrutar bandas para gravar pela Vadeca, e ele ouviu-nos, gostou, e ali estava. Claro que aceitámos, e em pouco tempo fomos assinar contrato na sede da Vadeca, dando início a algo verdadeiramente novo na vida de todos os elementos do Iodo.

Havia que preparar a imagem, dando início a sessões fotográficas. Os temas a gravar, de onde seríam escolhidos dois para o single. E agendar compromissos, tais como entrevistas para jornais e situações promocionais. E mais tarde a gravação do tele-disco.

As fotos queriam-se temáticas. Aproveitámos o nosso slogan "do mar para o rock" e fomos fazer fotografias para a Costa da Caparica, literalmente no mar. Na minha opinião, e transportando-nos à época, creio que o mote era bom, e causou algum impacto e até polémica, ver cinco gajos, vestidos, dentro de água, com instrumentos e tudo. Lembro-me que a Ibanez ficou com alguma sal-moura depois da dita sessão fotográfica. Segundo a contra-capa dos singles as fotos são do Luís Vasconcelos.


O tratamento dos temas selecionados foi feito na nossa sala de ensaio. Havia que selecionar quatro temas que seriam registados no estúdio, para editarmos 2. Os temas foram arestados ou formatados às normas ou exigências do mercado, levando uns cortes aqui e ali, uns retoques acolá, e até uma ligeira censura na letra do Malta à Porta.


Gravámos os 4 temas em dois dias, no Angel Studio, com o Manuel Fortes como técnico de som e o Manuel Cardoso, na produção.


A esta distância, ou seja, hoje, eu não tenho nenhuma dúvida em afirmar que o som Iodo é o som destes temas que gravámos. Era o som que nos caracterizava, que tocávamos em palco, e que de certa forma espelhava um trabalho colectivo, em que todos participam de igual forma.


Escutando os singles, e o LP, e comparando com os nossos concertos vemos que o som Iodo, dos singles é o que tem aquela garra e vivacidade, perdida práticamente no LP, salve-se uma tentativa no "Expiração de um Louco".


A passagem pelo Angel Studio foi tão volátil como a carreira dos Iodo. O que interessava era colocar os temas em fita, sem haver tempo a gastar, pois uma hora de estúdio custa dinheiro. Contudo nos quatro temas ficou fielmente registado o nosso som, e quem nos ouviu e viu ao vivo não encontrou grandes diferenças.


A voz do Madeira, a marcação do Alfredo, o som inconfundível do Luís, as malhas do Tó Pê, bem como os meus solos, estavam ali nos discos, tal como nos palcos, embora ao vivo o pessoal estendesse um pouco mais os temas, e principalmente após a saída do Malta à porta.


Sem fazermos ideia do que se iría passar, o nosso primeiro single tem um exito e aceitação muito considerável, tendo alcançado boas permanencias nos tops do Rock em Stock e do TNT, os programas de rádio mais escutados pela malta roqueira.
E a partir deste lançamento tudo foi mudando. O Iodo estava nas rádios, nos jornais,e até na tv, onde no seu sketch semanal o Herman José, fez uma versão do Malta à Porta em ritmo latino, com o seu personagem Tony Silva.



domingo, 20 de maio de 2007

Iodo - o início















A formação inicial do IODO:
(da direita para a esquerda)

Luís Cabral - teclados
Rui Madeira - vocalista
Tó Pê - baixo
Alfredo Antunes - bateria
Jorge Trindade - guitarra


O Iodo nasce como tantas de bandas de originais ou de covers, que vulgarmente se chamam de bandas de garagem.

As que me lembro aqui da zona, vulgarmente chamada de Margem Sul, ou outra margem, ou lado de lá, ou até margem esquerda, eram o Iodo, os UHF, os Xutos e os Rock & Vários.
Mais tarde aparecem o Grupo de Baile, do Seixal, mas já aproveitando a onda do tão falado Rock Português.
Alguns dos elementos do R&V vêm de uma banda de baile, que ensaiava perto de Azeitão, de nome Turma 66. E alguns fundadores do Grupo de Baile, tocaram no Código.

Na minha opinião e que penso partilhada por outros, a haver Rock Português e Pai do Rock, este nunca seria o Rui Veloso, mas sim os UHF.

Quando integrei o Iodo, já o Alfredo, baterista, tinha contactos com os UHF e com os Xutos. Eles eram para nós o exemplo e a motivação de que uma banda podia tocar rock e cantar em português, e acima de tudo podia gravar.
Os UHF já tinha editado o "Jorge Morreu", e os Xutos, o "Semen".
E o que dizer do êxito obtido com o "Cavalos de Corrida"?
Se ser pai do Rock é vender muito, neste caso os UHF foram-no.
Se era cantar em português, estas bandas já o faziam.
O fenómeno Rui Veloso fez abrir o circuito comercial, a músicos e bandas cantando em português, mas não o chamo de rockeiro. O Rui é muito mais R&B e baladeiro do que rockeiro.

Houve uma colagem estratégica que interessou a todas as partes.

Note-se que não estou a tirar nenhum mérito ao Rui Veloso. Sou adepto desde a primeira hora da obra dele. Conservo intacto o LP "Ar de Rock". São os temas dele que mais canto na minha onda acústica. Afirmo que ele é essencial ao panorama musical luso. Qua a música portuguesa sem ele sería mais pobre. Mas do que se trata aqui é da legitimidade da paternidade do Rock lusitano.

No caso Rui Veloso não podemos esquecer de dividir o mérito à aposta da editora, e ao génio Carlos Tê, pois sem ele o Rui seria muito menos.

E depois vem a questão: o que é rock e o que não é rock. Quem pode a rigor definir a fronteira? Um rock lento é um slow rock? Claro que não. E a que velocidade deixaría de o ser, se o fosse?
Rock cantado em inglês, por músicos portugueses encaixa na definição? Ou será anglo-luso?
Era necessário um rótulo. E este rótulo serviu para dar corpo a uma invasão de bandas que vinha à corrida do ouro, leia-se vinil, proporcionada pela avida procura das editoras.

Podemos também considerar mais outro pai do rock. O Júlio Izidro, que com as suas emissões de rádio em directo do cinema Nimas, ao sábado de manhã, com o seu "Febre de Sábado de Manhã" deu a divulgar ao país inteiro o tão recente fenómeno que era o Rock Português.

Mas era tudo comandado pelas editoras, não tenhamos ilusões. Tal como fora em 74 e 75 com as cantigas de intervenção, após a revolução de Abril, em que qualquer marmanjo vestido de ganga, barbudo e cabelo oleoso pegava numa viola com autocolantes do Che, e ao som dos acordes Dó, Fá e Sol, debitava umas quantas palavas tipo revolução, opressão, ditadura não, morte ao fascismo, etc.

Houve portanto na época um grande aproveitamento por parte de todos os interessados na abertura criada pelo sucesso do "Ar de Rock", e por isso essa onda teve de ter um nome: Rock Português. E teve de ter um pai: Rui Veloso. Já agora me pergunto quem será a mãe, se a Adelaide Ferreira ou a Lena d'Água... Ou o José Cid, que já se auto-proclamou de mãe...

Embora algumas das poucas biografias que rezam sobre o Iodo, digam que nós viemos com o boom, é mentira. Estávamos formados antes, e a trabalhar, embora todos saibamos que seria pouco provável que ascendessemos ao que tivemos se não fosse a boleia do boom.

Por outro lado, eu sempre defendi isso, a volátil projecção do Iodo e outros grupos, pode ter sido causadora de mortes prematuras. Não houve espaços para amadurecimentos nem capacidade para gerir derrotas. Estávamos na casa dos vinte anos, onde todos os sonhos e ilusões ainda nos são permitidos.

Por via da necessidade do mercado, muitos meninos saíram dos seus quartos onde cantarolavam os seus ídolos, e das suas garagens onde arranhavam uns temas ,e são colocados em palcos, com PA's, iluminação, público, programas de tv, top's nos rádios, hoteis, carros alugados, fãs, etc. Isto deslumbra qualquer um, e dá a errada sensação de que tudo é fácil e possível.

Hoje considero que se todos os elementos do Iodo, tivessem percorrido um caminho maior e acima de tudo mais duro, para chegar aos palcos e a um estúdio, o Iodo não teria acabado de forma tão efémera com acabou.

Voltando ao início.

Como já referi no post dedicado ao Eléctrico houve uma dificuldade da minha parte na forma de ensaiar.

Se nas formações anteriores a que pertenci, a música a ensaiar estava feita, e era uma questão de a copiar literalmente, tentando que a execução fosse tão parecida quanto possível ao original, aqui o caso era inverso.

No início íamos desbundando em cima de frases musicais que um ou outro apresentava, mas sem a construção da música definida.


Das primeiras Saídas aos Singles

Foi assim que aos poucos, o "Malta à Porta" e "a Canção" foram construídas. Aproveitando excertos e colando aqui e ali.

Já os temas dos lados B, "Aqueles Dias" e "Pedro e o Lobo" são da autoria do TóPê e minha, embora por acordo geral, os temas seriam registados como sendo da autoria da banda.

No "Malta à Porta", não temos um tema com o corpo habitual numa música comercial ou formal se assim podemos chamar. Ou seja, com introdução, estrofes, refrão e final, e eventualmente um solo a meio. Temos no nosso hit vários fragmentos colados, entre malhas imaginadas individualmente e juntas em grupo. O tema não tem refrão. Tem uma repetição da frase vejo malta à porta, mas que não considero refrão. Começa e termina com um coro "oh oho oh oho" mas com acordes diferentes. Fiz a letra (nunca gostei muito do que escrevo e acho que não tenho a arte) um pouco para forçar a construção da música.



Malta à Porta
(L.Cabral / A.Antunes / Topê / R.Madeira / J.Trindade)

Se pensas em andar pela rua à procura do amanhã
Podes ficar bem contigo, mas não és só tu
Não podes ficar preso a uma ilusão
Tens de ter amigos a quem dar a mão

Não queiras assinar documentos em papel molhado (1)
Pois ao fim e ao cabo sais sempre lixado (2)
Tens de fazer força pelo que há-de vir
Abre a tua mente e deixa-te ir

Deixa-te ir

Vejo malta à porta, vejo malta à porta
Há malta à porta, há malta à porta

(1) plágio descarado ao Sérgio Godinho.
(2) os ventos de censura ainda latentes nos anos 80, levaram o Manuel Cardoso, o nosso produtor a "sugerir" substituir a palavra lixado por cansado, como se ouve no disco.

O lado 2 do single é um tema muito genuíno. Todo construído pelo TóPê. Logo, todo TóPê.
O TP tinha tudo de génio e de louco. A música brotava de dentro dele, enquanto todos nós nos esforçavamos por um pouco de inspiração e originalidade.
O "Aqueles Dias" era um tema bem estruturado, e com muita força, tanto no disco como ao vivo.
Disco colocado no mercado contra a vontade do Iodo, "A Canção" tem como base um trecho musical que o Cabral desenvolveu, do qual sempre gostei partcularmente, que se escuta a seguir ao 2º refrão. A partir dessa composição construí o resto da "canção". É um tema muito "new-wave", não com a força do "malta à porta" mas na minha opinião, com um instrumental particularmente bem conseguido.


No lado 2, está "O Pedro e o Lobo". Para mim o tema mais fraco dos quatro que gravámos no Angel Studio. Mas na altura da gravação não pensávamos que alguma vez a música fosse editada...

Com outros temas originais, e no início recorrendo a alguns temas fortes do "Eléctrico", começámos a nossa incursão nos concertos. A colaboração dos UHF foi muito importante nesse sentido, pois abriu-nos as portas em alguns palcos, onde fizemos as primeiras partes deles. Aprendendo com eles sobre a forma de estar em palco, e tendo acesso à divulgação da nossa música, o que neste início era meio complicado pois todos os nossos temas eram desconhecidos.

DO MAR PARA O ROCK

Com os primeiros concertos, com o mealheiro do Eléctrico, e a agenda razoávelmente preenchida, o Iodo adquire o seu próprio PA da Furacão. Ficando a banda a ter uma total autonomia, não deixando no entanto de aproveitar as boleias que a banda do António Manuel Ribeiro nos proporcionava para fazer as primeiras partes.

Com todos os proveitos que tiramos em nos colarmos aos UHF, fazer as primeiras partes de uma banda cabeça de cartaz é sempre um trabalho complicado. Por tudo. Primeiro porque estamos um pouco à mercê da banda principal, e tudo tem de rodar conforme os seus desejos e vontades.

Desde o horário para fazer som, à disposição do back-line no palco, até ao próprio som que sai tanto para o palco como para o público, tudo está condicionado ao formato da banda principal. para não falar do público que óbviamente está no recinto para assistir ... à banda principal, que neste caso estava "em altas" graças ao estrondoso impacto que o "Cavalos de Corrida" provocou. Estávamos no início de 1980, e antes do "Chico Fininho" já se gritava por esses palcos fora: "agora, agora, agora, agora, tu és um cavalo de corrida..."

No caso dos concertos com os UHF, houve uma aceitação geral por parte do público deles ao nosso grupo, e além do mais as nossa bandas desenvolviam boas relações tanto a nível de músicos, como de road-managers, e roadies. Pelo que o trabalho era mais facilitado.

Além do mais o som UHF e o do Iodo, era totalmente diferente, embora por curiosidade eu e o Renato Gomes, o guitarrista e meu ex-colega de Liceu, tocássemos com duas guitarras exactamente iguais, as Gibson The Paul.

Em outros palcos, com outras bandas, por vezes existiam aquelas corriqueirices típicas da competição que nunca devia existir na música. Tipo chegarmos a um palco e os espaços estarem ocupados tão estratégicamente que ficava difícil colocarmos o nosso back-line de forma a permitirmos criar o nosso espaço habitual.

Música é partilha, logo não pode haver competição, porque não é desporto.

As bandas com as quais estivemos mais à vontade, foram os Trovante e os Jáfumega. Era um respeito mútuo, uma partilha que tinha como objectivo apenas servir quem nos iría escutar.

A pior experiência em tudo foi na primeira parte do Iggy Pop, no Dramático de cascais.Episódio a que me referirei detalhadamente.


E até pisarmos o palco do Rock Rendez-Vous e sermos convidados a gravar um single não demorou muito.
Penso que nenhum de nós pensou viver aqueles tempos de éfemero estrelato.



o pavilhão do Dramático






O IODO nas Paivas em 11.07.1980













os concertos do Iodo



Aqui ficam os registos que tenho, dos concertos e saídas promocionais do Iodo, desde o início até à minha saída. Incluo além das datas, os valores de cada um, e obsevações e curiosidades que acho importante destacar.
Alguns dados podem não estar completos pois estes registos foram feitos logo que saí do Iodo.

3.05.1980
Paio Pires. Festa da Juventude.
Neste evento tocámos musicas do Eléctrico e do Iodo.

7.11

Loures. Com os UHF - 8.000$00

28.11

Coimbra. Com os UHF e os GNR

13.12

Castelo Branco. Com os King Fisher Band - 35.000$00

Concerto onde estreamos o nosso PA Furacão


27.12

Alfeite. Tó Pê a solo na primeira parte


28.12

Alfeite - 8.000$00


30.01.1981

Santarém. Com os UHF - 10.000$00


3.02

Lisboa. Rock Rendez-Vous - 10.000$00


5.02

Lisboa. Rock Rendez-Vous -10.000$00

Estreia da Gibson


14.02

Coimbra. Com os Street Kids - 27.000$00


21.02

Benedita. Com os UHF - 15.000$00


12.03

Lisboa. Rock Rendez-Vous - 10.000$00


4.04

Tramagal - com os UHF - 15.000$00


11.04

Cova da Piedade,SFUAP - com os UHF e 26TMG - 15.000$00


2.05

Lisboa. Programa de rádio em directo Febre de Sábado de Manhã. No cinema Nimas.


5.05

Lisboa. Rock Rendez-Vous - 4.800$00


31.05

Lisboa. Estúdios da RTP no Lumiar. Programa em directo Passeio dos Alegres.


05.06

Grândola - 15.000$00


6.06

Cova da Piedade. SFUAP. Cinema - 10.000$00


13.06

Coimbra. Festival Só Rock


14.06

Paivas. Com os TIR - 15.000$00


26.06

Cascais. Pavilhão do Dramático. Primeira parte do Iggy Pop







4.07

Grândola. Para o PCP - 20.000$00

Estreia do Alcobia

11.07

Paivas. Para o PCP - 15.000$00

16.07

Rock Rendez-Vous - 12.000$00

17.07

Lisboa. Instituto das Belas Artes. Com várias bandas - 20.500$00

18.07

Porto de Mós. Com os Hob Nob - 30.000$00

25.07

Porto. Discoteca Iodo

31.07

Samora Correia. Com os Opinião Pública - 35.000$00

1.08

Vila Nova de Ourém. Com os Hot Band - 35.000$00

2.08

Pinhal Novo. Para o PCP - 15.000$00

6.08

Lisboa. Rossio. Manifesto "No Nuks", com várias bandas

O TóPê fugiu antes do concerto.

7.08

Gouveia - 36.000$00

13.08

Sines - 40.500$00

Estreia da bateria Pearl

14.08

Vieira de Leiria. Com os Magma - 45.000$00

15.08

Costa da Caparica. Com os 26TMG - 40.000$00

Levei com um pedregulho de gelo no sobrolho

16.08

Penamacôr. Com os Clepsidra - 45.000$00

22.08

Ferragudo. Com os Trovante - 40.000$00

O Tó Pê começou a partir o baixo em pleno concerto

23.08

Cabanas de Tavira. Com o Vasco Rafael - 45.000$00

28.08

Santa Maria de Lamas. Com os UHF - 63.000$00

4.09

Batalha. Com várias bandas - 35.000$00

5.09

Palmela. Com os UHF - 35.000$00

6.09

Lisboa. Alto da Ajuda. Festa do Avante

12.09

Estarreja. Com os Jáfumega - 55.000$00

25.09

Aveiro. Não houve condições para o concerto por causa de um ciclone.

26.09

Rossio ao Sul do Tejo. Com os Trovante - 10.000$00

Tocámos com o palco inundado.

27.09

Beja. Praça de touros. Com os Taxi - 50.000$00

3.10

Moscavide. Para a APU - 38.250$00

4.10

Paço d'Arcos. Festa de aniversário dos 6 de Portugal

Amadora. Com os Rock & Varius - 40.000$00

9.10

Lisboa. Pontinha. Para a APU -38.250$00

10.10

Pataias. Pizões. Com várias bandas - 60.000$00

30.10

Almada. Incrível Almadense. Com os Rock & Vários e os UHF - 35.000$00

31.10

Febre de Sábado de Manhã

Negrais. Com os Orpor - 35.000$oo

Porque tocámos mais 30 minutos ofereceram-nos um leitão assado.

1.11

Palmela. Quinta do Anjo. Para a APU - 38.250$00

8.11

Barreiro - 35.000$00

21.11

Passeio dos Alegres

28.11

Viseu. Carregal do Sal - 60.000$00

01.12

Elvas. Cine-Teatro - 50.000$00

05.12

Guimarães. Felgueiras. Com os Jáfumega - 65.000$00

12.12

Peniche. Autoguia da Baleia 60.000$00

19.12

Ponte de Sôr - 55.000$00

20.12

Vila Franca de Xira - festa do Musicalíssimo - 15.000$00

26.12

Tomar - 55.000$00

30.12

Rock Rendez-Vous - 3.000$00

31.12

Alfeite - particular

08.01.1982

Seixal. Sociedade Filarmónica União Seixalense. Com o Grupo de Baile

16.01

Portalegre - 55.000$00

23.01

Figueira da Foz - 75.000$00

06.02

Pataias. Com os TNT - 60.000$00

20.02

Portela de Sacavém - 55.000$00

28.02

Seixal. SFUS. Com os UHF - 50.000$00

05.03

Cova da Piedade. Com os UHF - 50.000$00

Já com a minha anunciada saída dos Iodo.



os bailes do Eléctrico





Aqui fica o registo dos bailes feitos pelo Eléctrico e seus locais e honorários. Bem como algumas curiosidades que irei descrevendo.




16.02.1980 a 19.02.1980
Clube do Alfeite - 12.000$00
6 bailes de Carnaval, quatro à noite (soirée) e dois de tarde (matinée).

29.02
Sobreda de Caparica - 7.000$00

1.03
Setúbal.Sociedade Capricho - 10.000$00

12.04
Almada.Clube das Torcatas - 6.000$00
Estreia do Rui Madeira

19.04
Barreiro.Leças - 6.000$00

20.04
Torre da Marinha.No IFCT, para a JCP - 4.500$00

26.04
Seixal.Mundet - 4.500$00

3.05
Paio Pires.Pavilhão da Siderurgia.Festival da Juventude
Concurso com outras bandas

10.05
Barreiro. Clube Paivense - 6.000$00

11.05
Cova da Piedade. para a JCP

30.05
Seixal.Sociedade Filaqrmónica Timbre Seixalense - 6.000$00
Zé Tó sustitui o Tó Pê

31.05
Almada. Tercena - 7.000$00

6.06
Seixal. Campo de futebol. Com o Sérgio Godinho - 7.500$00

7.06
Pinhal de Frades - 6.000$00

9.06
Manique de Baixo - 7.000$00

13.06
Almada. Clube das Torcatas - 6.000$00

14.06
Casal do Marco - 6.000$00
Baile sem o Madeira

20.06
Sesimbra. Sociedade Musical, para a JCP - 7.000$00
Baile sem o Madeira,e entra de novo o Tó Pê

21.06
Almada. Clube das Torcatas - 6.000$00
Cantou o Virgílio

22.06
Salvaterra de Magos. Para a Joframa - 10.000$00

23.06
Almada. Clube da Ramalha - 7.000$00
Regresso do Madeira

24.06
Almada. Clube da Ramalha - 7.000$00

28.06
Seixal. Baile de S.Pedro - 6.000$00

26.07
Barreiro. Lavradio - 7.000$00

10.08
Castelo Branco. Perais - 11.000$00
Acampámos de véspera na margem do rio Tejo, em Vila Velha de Rodão

16.08
Paço d'Arcos. Porto Salvo - 7.500$00

18.08
Coruche. Festas Populares - 10.000$00

23.08
Marinhas - 9.000$00

29.08
Pinhal Novo. Para a APU - 7.500$00

30.08
Almada. Para a APU - 7.500$00

5.09
Montijo. Para a APU - 7.500$00

6.09
Barreiro.Quinta da Lomba.Galitos - 6.000$00

8.09
Castelo Branco.Alfrívida - 11.000$00
Mais um acampamento no mesmo lugar.

13.09
Rio Maior. Festa da Lena

20.09
Coruche. Santana do Mato - 10.000$00

21.09
Almada. Incrível Almadende - 5.500$00

24.09
Almada. Pombal. Para a APU - 7.500$00

27.09
Almada. Tercena - 7.500$00

4.10
Trafaria. Bombeiros Voluntários - 6.000$00

18.10
Fernão Ferro. Centro Paroquial - 7.500$00

1.11
Lisboa. Casa do Alentejo - 9.900$00

8.11
Cova da Piedade. Para o PCP - 8.000$00

15.11
Marinhais. Cinema - 9.000$00

16.11
Coina - 5.500$00

23.11
Almada. Incrível Almadense - 5.500$00

20.12
Seixal. Timbre - 7.500$00

26.12
Costa da Caparica. Pêra do Meio - 7.500$00

31.12
Seixal. Timbre - 35.000$00

10.01.1981
Vale Fetal - 7.500$00

11.01
Cova da Piedade. SFUAP - 6.500$00

24.01
Coruche. Baile de Finalistas - 12.000$00

31.01
Cova da Piedade. SFUAP - 9.000$00

7.02
Cercal do Alentejo - 15.000$00
Primeiro baile com a Gibson

22.02
Cova da Piedade -SFUAP - 6.500$00

28.02 a 03.03
Pinhal Novo. Bailes de Carnaval - 75.000$00

14.03
Quinta do Conde 2 - 8.000$00

21.03
Paivas. Clube - 8.000$00

28.03
Arrentela. Sociedade - 8.000$00

29.03
Cova da Piedade.SFUAP - 7.000$00

18.04
Paivas. Clube - 7.500$00

24.04
Alcácer do Sal. Sociedade -15.000$00

2.05
Pinhal Novo - 9.000$00

15 e 16.05
Castelo Branco. Lousa - 28.000$00

17.05
Paio Pires. Siderurgia. para o PCP - 10.000$00

23.05
Zambujal - 8.500$00

30.05
Quinta do Conde 2 - 8.000$00

6.06
Barreiro. Quinta da Lomba. Galitos - 9.500$00

21.06
Estoril. Hotel Sintra-Estoril. Festa da Joframa - 15.000$00

23.06
Alcácer do Sal. Casebres - 12.000$00

E aqui está o registo das actuações do Eléctrico, que cumpriu na perfeição o seu mandato.
Há aqui a registar uma saída do Rui Madeira, que mais tarde voltaria à formação. Bem como do Tó Pê, um elemento muito instável, que nos deixava sempre inseguros quanto aos nossos compromissos assumidos.

Qualquer um deles foi substituído pelos meus antigos colegas da banda Código.









quinta-feira, 17 de maio de 2007

o pré - Iodo

Conheci o Luís Cabral, no Liceu Nacional de Almada, no Pragal, onde frequentámos um ano lectivo na mesma turma. Estava a a terminar o antigo 7ºano liceal.

Ele já sabia da minha faceta de músico, mas eu não sabia que ele tocava.

Uma vez, ele e o Rui Madeira, tinham-me visto tocar na SFUAP, Cova da Piedade, e gostaram dos meus solos à Santana retirados do Abraxas.

Nessa época, eu já tocava com o meu grande amigo Raúl Alcobia, nos Sound Five, e fazia o que podia com a minha Eko, amplificada pelo Yamaha, que ainda hoje conservo e a funcionar, e um pedal Elka de fuzz, muito em voga naqueles tempos.

Ainda no Sound Five vendi a Eko a não sei quem, e comprei uma Ibanez, na Custódio Cardoso, que era uma cópia descarada de Gibson Less Paul.
Para a época já era um guitarrão.


Dos Sound Five, o Alcobia foi para o Código, substituír o Espírito Santo, que viría a ser baterista dos UHF. E um pouco mais tarde houve uma vaga para guitarrista no Código, e o Alcobia tratou de me propor para preencher a vaga.

Pelo Código passaram músicos excelentes. O Virgílio, que chegou a ser vocalista dos Hossana. o Raminhos, trompete e trombone, que veio a integrar o Grupo de Baile. O Fernando Emanuel, hoje maestro, e já na altura um pianista apuradíssimo,e que vim a reencontrar recentemente no Baía, na minha actual actividade musical.

Nesses entretantos, e sempre que podia, eu exercia as funções de músico no Selim, uma boite muito famosa na época. Ali, evoluí muito com os músicos residentes. O Nelo, baixista na orquestra da EN, e também guitarrista, com uma excelente guitarra Burns, o "Gingalhinhas", um baterista do caraças, o Deniz, teclista e flautista, outro músico "enorme", que gravou um EP para a etiqueta Zip-Zip, e o Laureano, saxofonista, que tocava no Programa da Cornélia, na RTP 1.
No Selim, eu fazia as folgas dos músicos residentes, e tanto fazia a guitarra ou o baixo.
Mais tarde venho a fazer as folgas de domingo, nas teclas, com o Luís "Louco", e os irmãos Andrade, bateria, e guitarras, do Grupo de Baile.

No Código tocávamos a rigor temas dos Chicago, Blood,Sweat & Tears, Ekseption, Stevie Wonder, etc.



Hoje pergunto-me como era possível o pessoal dançar temas como Make me Smile, Saturday in the Park ou Spinnig Wheel. Músicas de grande qualidade mas que convenhamos, não eram lá muito dançaveis.

É no Código que adiquiro o potentíssimo Farfisa que mais tarde viría a ser o back-line do Cabral durante a minha permanência no Iodo.

Venho a reencontrar o Cabral num concerto do Ian Gillan, já a solo, no Estoril, nos finais de 1979 ou no início de 1980. Estava um pouco à toa em matéria de futuro musical, pois o Código estava a dissolver-se ou em vias de. Ele falou-me que tinha um projecto musical que passava por tocar temas apenas originais e cantados em português.

Com 22 anos, e uma considerável estrada de palcos, queria algo diferente, pelo que o projecto do Luís Cabral, parecia uma lufada de ar fresco. Esse projecto estava meio embrionário, tinha o nome de Iodo, nome alusivo ao iodo do mar, e integrava o Cabral nos teclados, com um recentíssito ARP que ele trouxe pessoalmente dos EU, e um sintetizador monofónico da Roland. O Alfredo Antunes, cujo zelo pelo estado imaculado da sua bateria logo me chamou a atenção. Note-se que eu vinha de um ambiente diferente, em que não havia um cuidado particular com o equipamento. E o TóPê, o baixista, músico que quando estava inspirado tirava a respiração a qualquer um. O TóPê era a veia inspiradora do Iodo. De certo modo um génio, com milhentas ideias na cabeça e alguma dificuldade em articular o que de dentro lhe saía. O TóPê tinha conflitos com os mais elementares valores que nos regem, como por exempo, horários, compromissos, etc.

E é assim que no início de 1980, começamos a ensair.

Havia um problema que à partida era preciso resolver: nao tínhamos baixo, nem amplificador para o baixo. Se por um lado eu queria algo diferente na música, por outro, o ritmo de ensaios e palcos a que vinha habituado, fazia-me falta. Além do mais, a banda precisava de dinheiro. E decidimos arrancar com um grupo paralelo, cujo principal objectivo era fazer bailes, para angariarmos fundos para a compra de equipamento. E é assim que nasce o grupo de baile O Eléctrico. Nome sugerido e aceite pelo Tó Pê.

Houve uma inicial dificuldade de adaptação ao modo de ensaiar. Eu vinha habituado ao rigor quase militar da estrutura de ensaio, que os metais do Código impunham, ou não fossem eles músicos da banda da GNR... Por outro lado este pessoal gostava de deixar a música fluir através de fragmentos de inspiração, de uma ou outra malha, ou pequenos excertos criados, e que numa forma de desbunda, daría origem a um tema.

Pode dizer-se que os mesmos músicos, com o mesmo equipamento, na mesma sala de ensaio, vestiam duas personalidades. Uma apenas prática e técnica, desprovida de qualquer inspiração para colocar o Eléctrico em marcha, e outra baseada na inspiração, troca de ideias, de letras, de acordes, esta sim já dando largas a qualquer modo de inspiração, e permitindo uma quase total liberdade na criação dos temas originais.

E cerca de um mês depois de começarmos a ensaiar, o Eléctrico fez a sua estreia na nossa casa mãe, se assim podemos chamar-lhe, no Centro Cultural do Alfeite , a 16 de Fevereiro. A proposta era simples: fazermos os bailes de Carnaval, à percentagem. Desses bailes, seis ao todo, conseguimos apurar 12.000$00... Mas o Eléctrico estava lançado.

Umas quantas cartas às colectividades, clubes e comissões de festas, serviram para colocar o Eléctrico em andamento. E começamos a angariar o tal necessário dinheiro. Assim que pudemos, adquirimos um HH para o baixo e uma guitarra baixo Ibanez, sem trastes, que mais tarde sería vendida ao Tim, dos Xutos.

Em Abril entra o Rui Madeira, para vocalista. Amigo de sempre do Cabral. Ele estava um pouco fora do projecto por vontade própria. Eles. o Madeira e o Cabral eram tal como eu e o Alcobia, amigos de infância, e partilhavam aquelas saudosas escutas de vinis que duravam horas.

A onda deles ía desde Deep Purple, Mike Oldfield a Motels.

O Madeira delirava com aqueles agúdos tirados da
voz do Ian Gillan, que influenciou muitas performances
de palco. E nos discos que gravámos.



A minha onda era muito Genesis e
Supertramp. E também partilhada pelo Alcobia.

Esta é a fase pré-Iodo, em que tivemos de nos adaptar uns aos outros, tivemos de usar de algum modo prático e comercial para conseguir angariar fundos para o suporte de material do Iodo. Ao mesmo tempo que começámos a compor e ensaiar os temas originais.

Creio que a fase do Eléctrico serviu também para nos rodar, e nos familiarizar com a estrada, pura e dura. Ora tocando em bons palcos e boas salas, com boas condições, ora tocando para a Comissão de Festas do Retaxo, em palcos improvisados.

Ao todo o Eléctrico teve 78 actuações até 23/06/81. Em Casebres, perto de Alcécer do Sal.

Apesar do propósito financeiro, o Eléctrico, foi uma saudável banda de bailes, com características muito invulgares, observando os padrões seguidos na época, e até mesmo nos dias de hoje.

Vestíamos todos de igual, umas roupas diferentes do convencional, confecionadas pela mãe do Cabral, que tinha uma fábrica de confecções. Era uma calça larga, azul escura, que contrastava com as calças justas tão na moda, e uma camisa de gola à padre, também azul. E calcávamos sapatinho branco.

Junte-se a isto uma grande dose de irreverência em palco, e um reportório ousado, e temos a receita para um grupo de bailde de sucesso.

Em parte a influência roqueira dáva-nos o mote para a tal irreverência, e muitas vezes tornámos actuações em pequenos concertos. Por isso tocávamos Devo, Pink Floyd, OMD, Buggles, com alguma fidelidade aos originais, bem como na hora de tocar músicas calmas, os chamados slows , tocávamos uma hora seguida para bom proveito dos casalinhos...